por Bruno Lucca | Folhapress
Dados sobre câncer de mama em pessoas trans ainda são escassos, mas isso não significa que a doença inexista no grupo. Aproveitando o Outubro Rosa, que visa a conscientização sobre a importância do acompanhamento médico para prevenção e tratamento do tumor, entidades estão dirigindo sua comunicação a essa população.
SBM (Sociedade Brasileira de Mastologia), SBOC (Sociedade Brasileira de Oncologia Clínica) e Antra (Associação Nacional de Travestis e Transexuais) têm alertado para os perigos da transfobia, desinformação e falta de acompanhamento médico adequado contra o desenvolvimento de tumores mamários em transexuais.
Segundo uma pesquisa realizada em 2019 pela University Medical Center, em Amsterdã, mulheres trans têm 47 vezes mais chances de desenvolver câncer de mama do que os homens cisgênero -identificados com o gênero corresponde ao sexo biológico.
Embora isso pareça um aumento expressivo, o estudo ressalta que o câncer de mama em homens cis é raro, cerca de 1% do total de diagnósticos anuais em todo o mundo.
O maior risco para transexuais femininas, segundo os pesquisadores, está ligado ao uso de hormônios para afirmação de gênero. Os cientistas acreditam que esse tipo de injeção hormonal pode gerar um aumento do risco de câncer na região, mas a teoria não é consensual, diz Maria Julia Calas, vice-presidente da SBM.
"A literatura médica sobre o tema é pouca. Isso está sendo mais estudado recentemente. Não se sabe ainda ao certo se o uso de hormônios por trans masculinos ou femininos teria relação com o aumento de chances de desenvolvimento do câncer de mama. É controverso", declara Calas.
A especialista, que há poucos meses fez uma publicação na plataforma médica Mastology, em que revisa todos os estudos sobre o tema, afirma que, mesmo sem a certeza de uma preocupação maior, há precauções a serem tomadas.
"O câncer de mama em homens cis é muito raro. Mas há atenção para mulheres trans, que nasceram biologicamente masculinas e usam hormônios femininos, que trazem o desenvolvimento mamário. Quando essas mulheres desenvolvem a mama, podem desenvolver doenças nela também. Essas doenças podem ser benignas ou malignas", diz Calas.
A aplicação irregular de silicone industrial nos seios, comum em indivíduos marginalizados desta população, também pode propiciar o surgimento de enfermidades mamárias.
Segundo a médica, a literatura de uma forma geral indica que mulheres trans, acima de 50 anos ou com tratamento hormonal há mais de cinco anos, façam periodicamente a mamografia de rastreio, o mesmo indicado para mulheres cis.
No caso de homens trans, que utilizam testosterona para masculinização, Calas alerta que aqueles que não realizaram a cirurgia de mastectomia -retirada das mamas- também devem fazer rastreio mamográfico periódico.
"O problema é que, por serem um grupo muito discriminado, essas pessoas deixam de procurar o serviço assistencial, que também não está preparado para recebê-las. Com isso, infelizmente, se perde o controle", afirma a vice-presidente da SBM.
Laura Testa, chefe do Grupo de Mama do Icesp (Instituto do Câncer do Estado de São Paulo) e membro da SBOC, também lamenta o pouco acompanhamento médico recebido pela população trans brasileira. Ela também diz que estudos recentes publicados sobre o tema, aliados ao despertar social para causas LGBTQIA+, ensinam muito aos profissionais da saúde.
"Importante estarmos debatendo o tema. É um aprendizado para todos. Mostra a evolução da sociedade, que nos proporciona avanços na ciência. Mesmo com poucos dados disponíveis sobre o tema em questão, há uma grande mensagem a ser deixada: sempre devemos buscar a prevenção", declara Testa.
Outra entidade que tem chamado atenção para o tema é a Antra, uma das organizações mais atuantes pelas causas transexuais no país, que utilizado suas redes sociais para divulgar informações sobre a prevenção, diagnóstico e tratamento do câncer de mama. A associação lamenta não haver pesquisas ou informações suficientes sobre a doença em pessoas trans.
Segundo pesquisa realizada na Faculdade de Medicina de Botucatu, no interior paulista, no ano passado, a proporção de cidadãos identificados como transgêneros ou não binários na população adulta brasileira é de aproximadamente 2%, o que representa quase 3 milhões de indivíduos considerando o Censo de 2010.
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